Muito Além de Calhambeques Envenenados

Figura 1: Hot Rod (fonte: http://en.wikipedia.org/wiki/File:T-bucket.jpg)

História:
Antes da Segunda Guerra Mundial, “roadsters” e “coupés” fabricados por empresas como Ford, Chevrolet e Plymouth já estavam sendo produzidos em grande escala, e por isso, acabaram por se tornar veículos bastante baratos. Com a popularização destes automóveis, houve também uma explosão de peças no mercado, capazes de melhorar suas performances. Surgiram assim os primeiros Hot Rods. O que essencialmente se buscava num Hot Rod era uma boa performance e potência. Por outro lado, o rebaixamento, corte da capota, seccionamento do corpo e pinturas mais radicais tornavam os veículos visualmente bem mais interessantes, e isto acabava por servir como um meio de expressão para seus proprietários, o que pode caracterizar um Hot Rod como uma obra artística.


Figura 2: Mais um Hot Rod (fonte: http://en.wikipedia.org/wiki/File:ThreeWindowCoupeHotrod6791.jpg)


O Ford Roadster 1932, popularmente conhecido como “Deuce”, emergiu como o favorito entre os Hot Rodders, talvez por seu peso leve, motor V8 (o “Deuce” foi o primeiro carro acessível a ter esse tipo de motor), preço acessível e mecância simples (sem um conhecimento profundo e com ferramentas domésticas era possível modificar um Roadster ’32). Novos V8 acessíveis foram surgindo, tais como Cadillacs, Oldsmobiles e Chevrolets, e foram também se popularizando entre os entusiastas do Hot Rod. Com o surgimento de novos carros e com o barateamento dos modelos mais antigos, a cultura foi se popularizando, e diversas categorias de Hot Rods foram surgindo, cada qual com suas peculiaridades.


Figura 3: Livros sobre o assunto (fonte: http://www.jalopyjournal.com/?p=6453)

Música Hot Rod e Influências na Cultura:
Um aspecto interessante da cultura Hot Rod é o fato de existir um estilo musical associado a ela. Após a decadência dos ídolos da primeira geração do Rock, em 1959, e antes da explosão dos Beatles, em 1964, há um período na música pop que as pessoas tendem a ignorar. E o interessante é que nesta época se produziu muita coisa boa. Os Beach Boys e a música "Louie Louie" são alguns exemplos. E é também nesta época que a música de exploração dos Hot Rods apareceu.
Sonoramente, a música Hot Rod é quase idêntica ao Surf Rock. As diferenças estão nos ruídos de carro “overdubados” por cima das faixas, nas capas com temáticas automobilísticas e, obviamente, no título das músicas (“Satan’s Chariot”, “Drag Beat”, “Little Deuce Coupe” e “Street Machine” são apenas alguns exemplos). Outra diferença do Hot Rod em relação ao Surf está na abrangência geográfica. O Surf, apesar de ter sido um fenômeno de massas, se restringia quase que somente à California, enquanto que o Hot Rod fazia sentido em boa parte do território dos EUA (um jovem texano, por exemplo, raramente podia ver o mar, mas podia perfeitamente possuir seu Hot Rod).






Figura 4: Alguns discos de música Hot Rod


Um disco que representa bem o que foi a música de exploração de Hot Rods é a coletânea da Del-Fi Hellbound Hot Rods!. A obra começa com seis gravações do Deuce Coupes. A origem desta banda está numa banda de Surf chamada The Avantis, mas os Deuce Coupes vão além do Surf Instrumental usual. Boa parte das músicas apresenta ruídos de carros, guitarras Telecaster em afinações unusuais (dá para perceber nitidamente o uso de guitarras-barítono, mais graves que as usuais), percurssões aceleradas e alguma influência de música Country.
Seguindo os Deuce Coupes, vem os De-Fenders. A sonoridade deles remete bastante à música de programas de TV. De fato, o guitarrista Tommy Tedesco emprestou sua Telecaster a várias cenas “go-go” de seriados dos anos 60. Vale à pena ainda lembrar que Tedesco chegou a gravar em sessões de gente como Phil Spector, Beach Boys e Jan & Dean. Outra característica dos De-Fenders são algumas doses de influências da cultura mexicana (“Taco Wagon” e “Tequila Joe” mostram isso bem).
A segunda metade do CD abre com músicas do Darts. Sua sonoridade é marcada por guitarras graves, e musicalidade semelhante ao Surf Rock usual (obviamente acrescida de ruídos de Hot Rods acelerando). Um dos méritos do Darts é o fato de um dos membros ter participado da clássica gravação de “Tequila”, com o The Champs, e ter quase sido um membro dos Beach Boys.
Fechando o álbum, há algumas músicas do The Roadsters, The Venturas (não confundir com The Ventures), e Opus 1. Este último aparece com a música “Back Seat 38 Dodge”, onde o Hot Rod se mescla (e bem!) com a psicodelia.
E é claro que o estilo não se restringe a esta coletânea. Trabalhos de gente como Rip Chords, Bobby Fuller Four, The Hondells e outros mostram o que foi a música Hot Rod, até seu sepultamento (após 1964, as gravadoras se desinteressaram pelos Hot Rods e passaram a buscar “novos Beatles”). Como se não bastasse, recentemente, bandas como The Apemen, Impala, Lord High Fixers e Monkeywrench (este, com membros do Mudhoney) resgatam vários ítens da cultura Hot Rod, como a paixão pelos carros, a sonoridade das músicas e o culto pelas figuras de chamas. Estas bandas podem muito bem serem rotuladas como “Hot Rod Revival”.


Figura 5: Influências na moda



Figura 6: Carrinhos Hot Wheels: Estimulando a cultura desde cedo

O mais interessante disto todo, talvez seja o fato de saber que por trás de “calhambeques envenenados” há toda uma arte, capaz de influenciar a música, programas de TV, design, moda, indústria de brinquedos e, sobretudo, o estilo de vida de várias pessoas...

Alguns "samples" de música de exploração de Hot Rods:

Renato, parabéns pelo post, rico em detalhes, e muito bem acompanhado pela trilha sonora!

Muito legal Renato, rico, informativo, e fiel ao retrato de um período não tão evidenciado na história do Rock.
Seria exagero afirmar que a série corrida maluca, da genial dupla William Hanna & Joseph Barbera sofreu influência deste período srsrsr???

Não tenha dúvidas!
Com a moda da psicodelia, os hot rods acabaram se incorporando também nesta estética. Designers como Tom Daniel, Ed Roth, George Barris (criador do Batmovel), entre outros entraram em uma onda dos chamados "show rods", que eram, em essência, os "hot rods da era da psicodelia":
https://www.google.com.br/search?hl=pt-BR&tok=bblPzn5BJz4BFrPSwHnabw&cp=9&gs_id=y&xhr=t&q=show+rods&safe=off&bav=on.2,or.r_gc.r_pw.r_qf.&bpcl=35466521&biw=1440&bih=799&um=1&ie=UTF-8&tbm=isch&source=og&sa=N&tab=wi&ei=quuKUPOhKMux0AHXxoDYAg .
Esses certamente influenciaram os desenhos animados da época. Uma outra influência para o Corrida Maluca, sem dúvida é esse "clássico da Sessão da Tarde", com os comediantes Peter Cook e Duddley Moore, entre outros:

SHIP ROOM ESTUDIO escreveu:Muito legal Renato, rico, informativo, e fiel ao retrato de um período não tão evidenciado na história do Rock.
Seria exagero afirmar que a série corrida maluca, da dupla William Hanna & Joseph Barbera sofreu influência deste período srsrsr???

Fala Renato querido, com sua permissão vou dar uma "upada" no tópico, pros novatos trolarem um pouco.srsrsr
Achei o tópico bacana demais pra não darmos mais uma especulada.

Opa! Vamos acelerar os hot rods!!!