Quarto Contracanto: O sertanejo universitário na era da imbecilidade monossilábica.
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Quarto Contracanto: O sertanejo universitário na era da imbecilidade monossilábica.
Olá a todos!
Continuando a série dedicada nesta coluna para textos não escritos por mim, eis um artigo que acabei de ler e que deixo aqui para os eventuais interessados.
O sertanejo universitário na era da imbecilidade monossilábica
Um movimento circular, no qual aquele que nada tem a oferecer intelectualmente alimenta com sua arte quem já se encontra morrendo de inanição cerebral
Rafael Teodoro, no Jornal Opção
"Há uma tendência idiomática, estudada pelos gramáticos e linguistas, e mesmo constatável empiricamente, que consiste na ação do falante de abreviar as palavras. Assim, palavras longas são reduzidas ao longo do tempo. Exemplo clássico encontra-se no pronome “vocês”. Esta forma, tal como se encontra hoje registrada nos léxicos, nem sempre se pôde considerar “correta”. Em Portugal, a nação europeia da qual o Brasil herdou seu idioma oficial, houve um tempo em que o pronome de tratamento real era “vossa mercê”. Expressão longa, a passagem dos séculos tratou de vulgarizá-lo, abreviando-o. Hoje o escrevemos apenas como “você” — considerando-o plenamente aceitável nos rígidos quadrantes da gramática normativa culta.
Talvez a necessidade de fluidez nos diálogos possa explicar, ao menos em parte, esse movimento de “encurtamento” das palavras numa língua. O interlocutor apressado deseja exprimir suas ideias e sentimentos com rapidez. Logo, usa de vocabulário que lhe proporcione a celeridade almejada. E é aí que a abreviação encontra campo fértil para desenvolver-se, porquanto parece ser de fácil compreensão que palavras curtas propiciam agilidade a uma conversa. Nos tempos presentes, na afamada “era digital”, esse movimento, outrora secular, acelerou-se. Hoje é possível notar sem dificuldades o recrudescimento do processo de abreviação das palavras de um dado idioma.
Para citar novamente o caso do “você”, nas redes sociais e nos programas de comunicação instantânea via internet, aquele pronome, cuja forma culta na atualidade já é uma redução da original, foi novamente “mutilado”, tornando-se um singelo “vc”. Idêntico fenômeno se observa no verbo “teclar”: quando usado na denotação de “acionar por meio de teclas”, o usuário da internet tem preferido um simples “tc”.
Essas transformações linguísticas, se de um lado operam-se nos rastros das consequências sociais da globalização — aquilo que o sociólogo Zygmunt Bauman chamou de “modernidade líquida” —, de outro decorrem de uma tentativa de estabelecimento de um signo linguístico capaz de comportar uma sociedade acelerada e sem freio. Eis o “idioma da velocidade”.
O “idioma da velocidade”, dessa maneira, pode-se considerar como sendo o sistema de comunicação mediante o qual o interlocutor prioriza a ligeireza da interlocução: o diálogo deve ser rápido, fluido, “líquido”, mesmo que, para tal fim, seja preciso sacrificar regras comezinhas de sintaxe ou abreviar impiedosamente as palavras.
Um conceito obscuro no cancioneiro nacional
A ideia de “idioma da velocidade”, que ora estou a propor, encontrou terreno fecundo na música comercial brasileira. Especificamente, refiro-me ao gênero que se convencionou chamar de “sertanejo universitário” — atualmente dominante em todas as rádios do País.
O conceito de “sertanejo universitário” é dos mais obscuros do cancioneiro nacional. Trata-se de uma aparente “contradictio in terminis”, afinal, “sertanejo” remete à ideia de “sertão”, área agreste, rústica, visto que distanciada dos grandes centros urbanos. Já “universitário” é adjetivo que se liga incontinenti à “universidade”, isto é, espaços de difusão dos saberes científico e filosófico e que, o mais das vezes, situam-se justamente em áreas de intensa urbanização. Por isso, já houve quem quisesse definir “sertanejo universitário” como sendo o “caipira que passou no vestibular” ou “o cidadão urbano com origens no sertão”. Nenhum desses conceitos, é claro, corresponde à realidade. De “sertanejo” esse universitário não tem absolutamente nada. Cuida-se, sim, da juventude da cidade que decidiu colocar um chapéu de cowboy e “cair na balada”.
Do ponto de vista musical, o sertanejo universitário hoje é um gênero musical utilizado comumente para designar a fórmula da “música dançante feita para gente descerebrada”. É o correspondente hodierno, do século 21, ao que foi a axé music no fim do século 20, mais precisamente na década de 1990: a demonstração cabal de que o físico alemão Albert Einstein estava certo quando afirmou: “Duas coisas são infinitas: o universo e a estupidez humana. Mas, quanto ao universo, ainda não estou completamente certo disso”.
A década perdida da música brasileira
Recordando os tristes anos de 1990, a década perdida da música brasileira, o império da axé music na indústria fonográfica nacional proporcionou algumas das mais constrangedoras composições que alguém, supostamente um ser racional, já foi capaz de escrever. Naqueles idos, expressões do quilate de “vai dançando gostoso, balançando a bundinha” tornaram-se símbolos de uma geração destruída pelo assédio constante da lógica hedonista do “prazer carnavalesco ininterrupto, curtição acéfala e exibicionismo de corpos plasticamente esculpidos na academia”. Era o princípio de uma tendência irrefreável, que só se acentuaria ao longo dos anos na música brasileira: a substituição do cérebro pelas nádegas. Era o começo da MIB: Música Imbecil Brasileira. O acrônimo de uma geração de jovens destruída pela estultice.
O grau de estupidez a que os ouvidos humanos foram submetidos nessa “idade das trevas” das rádios do País pode ser muito bem representado num dos hits do mais emblemático dos grupos surgidos no período. Refiro-me ao É o Tchan e a sua antológica “Na boquinha da garrafa”, sucesso radiofônico absoluto, cujas coreografias foram repetidas incessantemente em programas de auditório dominicais, com suas dançarinas calipígias “engatando” bem-sucedidas carreiras nas capas de revistas masculinas e no mundo das sub-celebrity. Vejamos: “No samba ela gosta do rala, rala. Me trocou pela garrafa. Não aguentou e foi ralar. Vai ralando na boquinha da garrafa. É na boca da garrafa. Vai descendo na boquinha da garrafa. É na boca da garrafa”.
A letra dispensa comentários e, por si só, revela a mais absoluta falta de respeito próprio, menos de quem compôs e produziu o grupo — um empresário na tarefa de lucrar na indústria do kitsch —, mais da parte de quem anotou na sua biografia momentos de supremo constrangimento “ralando na boquinha da garrafa”.
Quanto ao exibicionismo a que me refiro como caracterizador do período, este se notava na quantidade imensa de pessoas que passaram a trajar abadás multicoloridos qual uniformes denotativos de um suposto status citadino jovem, com os símbolos do “carnaval fora de época”. Havia mesmo uma hierarquia curiosa nas vestimentas: dependendo da cor do abadá, o sujeito era “playboy/patricinha” ou “pobre/povão”, pois já se sabia antecipadamente o preço elevado que se pagava para estar no bloco da “cervejada” ou dos “chicleteiros”, relegando o setor da “pipoca” para o vulgacho empobrecido. Foi também uma época de criatividade única no desenvolvimento de coreografias para as muitas “danças” que surgiam: do vampiro, da manivela, da tartaruga, do tamanduá, do morcego. Quase toda a fauna brasileira foi vilipendiada, digo, homenageada nessas composições.
Ivete Sangalo merece uma atenção especial. Originalmente vocalista da Banda Eva, seguiu o caminho para o qual todo “artista” de axé está direcionado: a carreira solo. Sangalo soube aproveitar como ninguém a catapulta. Carismática e muito bem assessorada, ela sabia que seu repertório grotesco não a sustentaria mais do que alguns verões fora de Salvador. Assim, tratou de cultivar uma imagem que a projetasse como cantora para além da axé music, que principiava a agonizar nas vendas das gravadoras. Hoje, contando com o apoio de quase toda a mass media brasileira, que a tem por “grande cantora”, é empurrada “goela abaixo” do público pela televisão, que lhe dá um espaço imenso nos principais canais abertos, sem contar os sucessivos apelos propagandísticos. Mas nem toda a máquina publicitária pode esconder a péssima qualidade do seu repertório, que não resiste a um exame qualitativo mais minucioso. “Carro velho”, sucesso comercial na sua voz, revela bem o quão criativa é a leitura de mundo da cantora: “Cheiro de pneu queimado. Carburador furado. Coração dilacerado. Quero meu negão do lado. Cabelo penteado. No meu carro envenenado. Eu vou, eu vou, então venha. Pois eu sei. Que amar a pé, amor. É lenha”.
Nos anos 2000, no entanto, a axé music entrou em colapso no mercado. Os carnavais fora de época (micaretas) foram aos poucos desaparecendo pela perda crescente de público. Os grupos “clássicos” do período deixaram de existir não por brigas de seus integrantes, mas pela simples falta de shows. O mercado usou e abusou da axé music enquanto era lucrativa. Quando deixou de sê-lo, descartou-a, substituída que foi, nas rádios comerciais, pelo forró universitário e pelo funk carioca (cuja nomenclatura correta é “batidão”). Nem mesmo o movimento da “suingueira”, capitaneado por “pérolas” do nível de “Rebolation”, associado a um amplo apelo midiático que tem por diretriz espicaçar os “sucessos do carnaval”, conseguiu ressuscitar o declínio inexorável daquele gênero musical moribundo.
O jovem hedonista do século 21 no Brasil
Entretanto, o mercado, no capitalismo, nunca pode parar na sua incessante busca pela rentabilidade. Ele precisa encontrar novos meios de entretenimento que gerem lucros vultosos. A fórmula mais fácil disso é, indiscutivelmente, estimular a imbecilidade da juventude. Sem escrúpulos.
Os meios de comunicação de massa cumprem, então, o seu papel: associam a ideia de “ser jovem” com a de “ser um imbecil”, aqui entendido como um irresponsável, que não se importa com nada que não seja o próprio prazer, imediato, rápido, fluido, como deve ser a linguagem nos tempos da globalização digital.
O sertanejo universitário surge nesse contexto. Ele vem ocupar o espaço dos ritmos que se prestam a proporcionar “diversão sem compromisso”, expressão que não quer outra coisa senão mascarar a baixíssima qualidade da música produzida, além de servir como sentença de absolvição da mediocridade humana de quem ouve esse estilo. Entender o estereótipo do sertanejo universitário, dessa maneira, afigura-se como sendo da mais alta relevância para a compreensão da ideia corrente do que é ser um jovem hedonista no século 21. É o desafio a que me proponho a partir de agora.
O perfil estereotípico do sertanejo universitário
Naturalmente, numa empresa dessa envergadura, precisarei recorrer às letras de algumas das composições mais representativas do estilo. Cuida-se de analisar como pensam os grandes artistas do gênero para, ao final, robustecer um juízo estético-sociológico sobre este conceito indecifrável do “sertanejo universitário”.
Nesse sentido, creio que uma das suas primeiras características é o desapego aos estudos. O sertanejo universitário é um hedonista por excelência. Seu adágio popular dileto, alçado à condição de mote da própria vida, é o clichê: “Pra que estudar se o futuro é a morte?”.
Desse modo, pode ser concebido como um jovem, de péssima formação intelectual e que, a despeito de cursar uma faculdade, não está nem um pouco preocupado com os estudos. Para ele, só existe a balada (o prazer imediato). É o que notamos na composição “Bolo doido”, da dupla “Guilherme e Santiago”: “Ai ai ai sexta-feira chegou! quem não guenta bebe leite e quem guenta vem comigo. Na sexta-feira o bar virou uma micareta. Mulherada foi solteira e os meus amigos loucos pra beber. Da faculdade eu fui pra festa tomar todas com a galera. E fiz amor até amanhecer. Toquei direto, fui à praia com as gatinhas na gandaia. Minha galera bota é pra ferver. Segunda de madrugada, travado, cheguei em casa. Sete horas acordei com uma ressaca, tinha prova pra fazer”.
Mas o sertanejo universitário, para levar uma vida de “baladeiro”, necessita de dinheiro, pois o vil metal tem o condão de, simultaneamente, torná-lo cliente especial da sociedade de consumo e despertar o interesse das garotas mais lindas da balada — verdadeiras empreendedoras no varejo dos relacionamentos humanos. Ele é, assim, um sujeito endinheirado. É o que se observa na composição “Camaro amarelo”, da dupla Munhoz e Mariano: “Quando eu passava por você. Na minha CG você nem me olhava. Fazia de tudo pra me ver, pra me perceber. Mas nem me olhava. Aí veio a herança do meu ‘véio’. E resolveu os meus problemas, minha situação. E do dia pra noite fiquei rico. ‘To’ na grife, ‘to’ bonito, ‘to’ andando igual patrão. Agora eu fiquei doce igual caramelo. ‘To’ tirando onda de Camaro amarelo. E agora você diz: vem cá que eu te quero. Quando eu passo no Camaro amarelo”.
Já sabemos, portanto, que o sertanejo, do tipo universitário, é jovem, de posses, sai da faculdade com seu Camaro amarelo direto para a balada e “bota a galera pra ferver”. Há quem lhe custeie os estudos. E, ainda que ao final de quatro ou cinco anos saia da faculdade no nível de um analfabeto funcional, seus genitores são suficientemente influentes para arranjar-lhe uma boa posição na iniciativa privada ou mesmo no serviço público.
O sertanejo universitário é sujeito destemido, porém sensível. Tem o dom da poesia incrustado nas suas veias. Na balada, este santuário da “pegação da mulherada”, sente a verve aflorar com facilidade, produzindo versos riquíssimos, como os que se notam na composição “Ai se eu te Pego”, do cantor Michel Teló: “Sábado na balada. A galera começou a dançar. E passou a menina mais linda. Tomei coragem e comecei a falar. Nossa, nossa. Assim você me mata. Ai se eu te pego, ai ai se eu te pego”.
De fato, é preciso ser muito perspicaz para rimar “dançar” com “falar”. Sobretudo, me impressiona a profundidade dos versos: quando passa a menina mais linda, ele toma coragem e fala. É um movimento controlado, premeditado. O eu lírico “toma coragem” e “parte para a caça” na balada. Inspirado pela beleza da garota, ele se aproxima e a corteja de uma maneira que qualquer mulher, de Carla Perez a Susan Sontag, sentir-se-ia enamorada: “Ai se eu te pego”, “ai se eu te pego”, ele repete à exaustão o verso aos ouvidos da “garota mais gostosa”.
Contudo, talvez a característica mais significativa desta personagem — o sertanejo universitário — seja mesmo a preferência pelo “idioma da velocidade”. Sertanejo que é sertanejo universitário evita a prolixidade; é sucinto, direto, objetivo. Sua linguagem despreza floreios verbais, construções frasais longas, vocábulos de difícil entendimento. Dado o portento de seu talento poético, ele acentua a desnecessidade do vocabulário complexo, adepto que é da lógica do “dizer muito com muito pouco” ou do “falar fácil é que é difícil”. Conhecedor profundo da fonologia da gramática da língua portuguesa, ele lança mão do rico alfabeto fonético do idioma românico-galego e, conjugando-o com seu ideal filosófico de concisão e com as técnicas redacionais modernas que enaltecem o “texto enxuto”, passa a compor valorizando a mínima emissão de voz na entonação dos seus versos, economizando em palavras o que pode expressar, em seu entender, perfeitamente com vocábulos monossílabos. É daí que nasce a tendência manifesta das composições do estilo em priorizar a vocalização de uma única sílaba. Exemplificativamente, temos: “Eu quero tchu, eu quero tcha”, de João Lucas e Marcelo: “Eu quero tchu, eu quero tchã. Eu quero tchu tcha tcha tchu tchu tchã. Tchu tcha tcha tchu tchu tchã”.
“Eu quero tchu, eu quero tcha” é, sem dúvida, um dos mais formidáveis exemplos de como se pode economizar palavras, de como se pode fundir o dígrafo consonantal “ch” com o “t” e uma vogal (“a” ou “u”) e criar um hit nacional. O significado poético-filosófico do “tchu” e do “tcha” na composição também merece registro: o eu lírico cria um jogo de contrastes, antitético como as leis da dialética, onde o “tchu” só existe para o “tcha”, de modo que não pode haver “tcha” sem “tchu” nem “tchu” sem “tcha”. Daí o porquê de invocar-se as expressões alternadamente, silabando-as na velocidade da luz: “Tchu tcha tcha tchu tchu tchã”.
Na mesma linha vem a composição “Tchá tchá tchá”, cantada por Thaeme e Thiago: “Ai que vontade, ai que vontade que me dá. De te colocar no colo e fazer o tchá tchá tchã. Tchá tchá tchá, Tchá tchá tchã. Tchá tchá tchá, Tchá tchá tchã. De beijar na sua boca fazer o tchá tchá tchã. Tchá tchá tchá, Tchá tchá tchã. Tchá tchá tchá, Tchá tchá tchã. De beijar na sua boca e fazer o tchá tchá tchã”.
Outro exemplo notável do uso de monossílabos é observável em “Lê lê lê”, de João Neto e Frederico. Vejamos: “Sou simples. Mas eu te garanto. Eu sei fazer o Lê lê lê. Lê lê lê. Lê lê lê. Se eu te pegar você vai ver. Lê lê lê. Lê lê lê”.
Mais uma vez temos o eu lírico usando de monossílabos, economizando em palavras, porque riqueza vocabular tornou-se algo desprezível. Sendo possível conotar com um mero “lê”, por que falar mais? O “lê, lê, lê”, no entanto, guarda uma mensagem subliminar perigosa: se tomado isoladamente na segunda pessoa do imperativo afirmativo, pode vir a constituir-se em ordem para leitura. Nada mais distante do que pretende o compositor e a “filosofia de vida” que anima o sertanejo que frequenta a universidade. Logo, é preciso apreender o “lê lê lê” de maneira contextualizada, ou seja, como registro onomatopaico que emula o sentimento de auto compensação libidinosa do eu lírico diante da vergonha que é, numa sociedade de consumo, ter uma condição financeira oprobriosa.
A era da imbecilidade monossilábica
A partir das breves linhas expostas acima, penso que o leitor já se encontra habilitado a conceituar este personagem enigmático do cancioneiro nacional: o sertanejo universitário. Trata-se de um modelo hedônico de uma sociedade capitalista hedonista, marcadamente voltado ao consumo, onde ser um “idiota”, um “imbecil completo”, não só não é motivo de desonra — própria e familiar — como se consubstancia num status socialmente tolerado (diria mesmo instigado). É o estereótipo desejável da sociedade globalizada por relações líquidas sob o elo do idioma da velocidade: no falar, no vestir, no relacionar-se, tudo que se refere ao gênero humano passa numa piscadela. Na música, não é diferente. Predomina o sertanejo universitário como o modelo supremo da juventude irresponsável, mediocrizada, de baixíssimo nível cultural. As composições são cunhadas no esteio da pobreza vocabular de quem as escreve, mas também de quem as canta — em ambos os casos denunciando a mais absoluta falta de leitura. É um autêntico movimento circular, no qual aquele que nada tem a oferecer intelectualmente alimenta com sua arte quem já se encontra morrendo de inanição cerebral.
Por essas razões é que me sinto autorizado a declarar que, depois da hecatombe cerebral que a axé music proporcionou na década de 1990, contribuindo decisivamente na deseducação do povo brasileiro com seus versos de “balançando a bundinha” e “boquinha da garrafa”, o sertanejo universitário, gestado pela indústria fonográfica em crise, desponta como o meio mais fácil de lucrar em cima do desejo hedonístico, cotidianamente instigado pelos meios de comunicação, que impele o jovem a aproveitar a vida a qualquer preço, de qualquer maneira, custe o que custar — incluindo o próprio senso do ridículo daqueles aos quais falta massa encefálica para perceber o quão patético é idolatrar “artistas” incapazes de compor com vocábulos polissílabos. É quando aos olhos de uma garota, na balada, torna-se “bonito” ser um completo idiota. Com o sertanejo universitário, a MIB entrou definitivamente na “era da imbecilidade monossilábica”.
Rafael Teodoro é advogado e músico.
Fonte: http://www.jornalopcao.com.br/posts/opcao-cultural/o-sertanejo-universitario-na-era-da-imbecilidade-monossilabica
Continuando a série dedicada nesta coluna para textos não escritos por mim, eis um artigo que acabei de ler e que deixo aqui para os eventuais interessados.
O sertanejo universitário na era da imbecilidade monossilábica
Um movimento circular, no qual aquele que nada tem a oferecer intelectualmente alimenta com sua arte quem já se encontra morrendo de inanição cerebral
Rafael Teodoro, no Jornal Opção
"Há uma tendência idiomática, estudada pelos gramáticos e linguistas, e mesmo constatável empiricamente, que consiste na ação do falante de abreviar as palavras. Assim, palavras longas são reduzidas ao longo do tempo. Exemplo clássico encontra-se no pronome “vocês”. Esta forma, tal como se encontra hoje registrada nos léxicos, nem sempre se pôde considerar “correta”. Em Portugal, a nação europeia da qual o Brasil herdou seu idioma oficial, houve um tempo em que o pronome de tratamento real era “vossa mercê”. Expressão longa, a passagem dos séculos tratou de vulgarizá-lo, abreviando-o. Hoje o escrevemos apenas como “você” — considerando-o plenamente aceitável nos rígidos quadrantes da gramática normativa culta.
Talvez a necessidade de fluidez nos diálogos possa explicar, ao menos em parte, esse movimento de “encurtamento” das palavras numa língua. O interlocutor apressado deseja exprimir suas ideias e sentimentos com rapidez. Logo, usa de vocabulário que lhe proporcione a celeridade almejada. E é aí que a abreviação encontra campo fértil para desenvolver-se, porquanto parece ser de fácil compreensão que palavras curtas propiciam agilidade a uma conversa. Nos tempos presentes, na afamada “era digital”, esse movimento, outrora secular, acelerou-se. Hoje é possível notar sem dificuldades o recrudescimento do processo de abreviação das palavras de um dado idioma.
Para citar novamente o caso do “você”, nas redes sociais e nos programas de comunicação instantânea via internet, aquele pronome, cuja forma culta na atualidade já é uma redução da original, foi novamente “mutilado”, tornando-se um singelo “vc”. Idêntico fenômeno se observa no verbo “teclar”: quando usado na denotação de “acionar por meio de teclas”, o usuário da internet tem preferido um simples “tc”.
Essas transformações linguísticas, se de um lado operam-se nos rastros das consequências sociais da globalização — aquilo que o sociólogo Zygmunt Bauman chamou de “modernidade líquida” —, de outro decorrem de uma tentativa de estabelecimento de um signo linguístico capaz de comportar uma sociedade acelerada e sem freio. Eis o “idioma da velocidade”.
O “idioma da velocidade”, dessa maneira, pode-se considerar como sendo o sistema de comunicação mediante o qual o interlocutor prioriza a ligeireza da interlocução: o diálogo deve ser rápido, fluido, “líquido”, mesmo que, para tal fim, seja preciso sacrificar regras comezinhas de sintaxe ou abreviar impiedosamente as palavras.
Um conceito obscuro no cancioneiro nacional
A ideia de “idioma da velocidade”, que ora estou a propor, encontrou terreno fecundo na música comercial brasileira. Especificamente, refiro-me ao gênero que se convencionou chamar de “sertanejo universitário” — atualmente dominante em todas as rádios do País.
O conceito de “sertanejo universitário” é dos mais obscuros do cancioneiro nacional. Trata-se de uma aparente “contradictio in terminis”, afinal, “sertanejo” remete à ideia de “sertão”, área agreste, rústica, visto que distanciada dos grandes centros urbanos. Já “universitário” é adjetivo que se liga incontinenti à “universidade”, isto é, espaços de difusão dos saberes científico e filosófico e que, o mais das vezes, situam-se justamente em áreas de intensa urbanização. Por isso, já houve quem quisesse definir “sertanejo universitário” como sendo o “caipira que passou no vestibular” ou “o cidadão urbano com origens no sertão”. Nenhum desses conceitos, é claro, corresponde à realidade. De “sertanejo” esse universitário não tem absolutamente nada. Cuida-se, sim, da juventude da cidade que decidiu colocar um chapéu de cowboy e “cair na balada”.
Do ponto de vista musical, o sertanejo universitário hoje é um gênero musical utilizado comumente para designar a fórmula da “música dançante feita para gente descerebrada”. É o correspondente hodierno, do século 21, ao que foi a axé music no fim do século 20, mais precisamente na década de 1990: a demonstração cabal de que o físico alemão Albert Einstein estava certo quando afirmou: “Duas coisas são infinitas: o universo e a estupidez humana. Mas, quanto ao universo, ainda não estou completamente certo disso”.
A década perdida da música brasileira
Recordando os tristes anos de 1990, a década perdida da música brasileira, o império da axé music na indústria fonográfica nacional proporcionou algumas das mais constrangedoras composições que alguém, supostamente um ser racional, já foi capaz de escrever. Naqueles idos, expressões do quilate de “vai dançando gostoso, balançando a bundinha” tornaram-se símbolos de uma geração destruída pelo assédio constante da lógica hedonista do “prazer carnavalesco ininterrupto, curtição acéfala e exibicionismo de corpos plasticamente esculpidos na academia”. Era o princípio de uma tendência irrefreável, que só se acentuaria ao longo dos anos na música brasileira: a substituição do cérebro pelas nádegas. Era o começo da MIB: Música Imbecil Brasileira. O acrônimo de uma geração de jovens destruída pela estultice.
O grau de estupidez a que os ouvidos humanos foram submetidos nessa “idade das trevas” das rádios do País pode ser muito bem representado num dos hits do mais emblemático dos grupos surgidos no período. Refiro-me ao É o Tchan e a sua antológica “Na boquinha da garrafa”, sucesso radiofônico absoluto, cujas coreografias foram repetidas incessantemente em programas de auditório dominicais, com suas dançarinas calipígias “engatando” bem-sucedidas carreiras nas capas de revistas masculinas e no mundo das sub-celebrity. Vejamos: “No samba ela gosta do rala, rala. Me trocou pela garrafa. Não aguentou e foi ralar. Vai ralando na boquinha da garrafa. É na boca da garrafa. Vai descendo na boquinha da garrafa. É na boca da garrafa”.
A letra dispensa comentários e, por si só, revela a mais absoluta falta de respeito próprio, menos de quem compôs e produziu o grupo — um empresário na tarefa de lucrar na indústria do kitsch —, mais da parte de quem anotou na sua biografia momentos de supremo constrangimento “ralando na boquinha da garrafa”.
Quanto ao exibicionismo a que me refiro como caracterizador do período, este se notava na quantidade imensa de pessoas que passaram a trajar abadás multicoloridos qual uniformes denotativos de um suposto status citadino jovem, com os símbolos do “carnaval fora de época”. Havia mesmo uma hierarquia curiosa nas vestimentas: dependendo da cor do abadá, o sujeito era “playboy/patricinha” ou “pobre/povão”, pois já se sabia antecipadamente o preço elevado que se pagava para estar no bloco da “cervejada” ou dos “chicleteiros”, relegando o setor da “pipoca” para o vulgacho empobrecido. Foi também uma época de criatividade única no desenvolvimento de coreografias para as muitas “danças” que surgiam: do vampiro, da manivela, da tartaruga, do tamanduá, do morcego. Quase toda a fauna brasileira foi vilipendiada, digo, homenageada nessas composições.
Ivete Sangalo merece uma atenção especial. Originalmente vocalista da Banda Eva, seguiu o caminho para o qual todo “artista” de axé está direcionado: a carreira solo. Sangalo soube aproveitar como ninguém a catapulta. Carismática e muito bem assessorada, ela sabia que seu repertório grotesco não a sustentaria mais do que alguns verões fora de Salvador. Assim, tratou de cultivar uma imagem que a projetasse como cantora para além da axé music, que principiava a agonizar nas vendas das gravadoras. Hoje, contando com o apoio de quase toda a mass media brasileira, que a tem por “grande cantora”, é empurrada “goela abaixo” do público pela televisão, que lhe dá um espaço imenso nos principais canais abertos, sem contar os sucessivos apelos propagandísticos. Mas nem toda a máquina publicitária pode esconder a péssima qualidade do seu repertório, que não resiste a um exame qualitativo mais minucioso. “Carro velho”, sucesso comercial na sua voz, revela bem o quão criativa é a leitura de mundo da cantora: “Cheiro de pneu queimado. Carburador furado. Coração dilacerado. Quero meu negão do lado. Cabelo penteado. No meu carro envenenado. Eu vou, eu vou, então venha. Pois eu sei. Que amar a pé, amor. É lenha”.
Nos anos 2000, no entanto, a axé music entrou em colapso no mercado. Os carnavais fora de época (micaretas) foram aos poucos desaparecendo pela perda crescente de público. Os grupos “clássicos” do período deixaram de existir não por brigas de seus integrantes, mas pela simples falta de shows. O mercado usou e abusou da axé music enquanto era lucrativa. Quando deixou de sê-lo, descartou-a, substituída que foi, nas rádios comerciais, pelo forró universitário e pelo funk carioca (cuja nomenclatura correta é “batidão”). Nem mesmo o movimento da “suingueira”, capitaneado por “pérolas” do nível de “Rebolation”, associado a um amplo apelo midiático que tem por diretriz espicaçar os “sucessos do carnaval”, conseguiu ressuscitar o declínio inexorável daquele gênero musical moribundo.
O jovem hedonista do século 21 no Brasil
Entretanto, o mercado, no capitalismo, nunca pode parar na sua incessante busca pela rentabilidade. Ele precisa encontrar novos meios de entretenimento que gerem lucros vultosos. A fórmula mais fácil disso é, indiscutivelmente, estimular a imbecilidade da juventude. Sem escrúpulos.
Os meios de comunicação de massa cumprem, então, o seu papel: associam a ideia de “ser jovem” com a de “ser um imbecil”, aqui entendido como um irresponsável, que não se importa com nada que não seja o próprio prazer, imediato, rápido, fluido, como deve ser a linguagem nos tempos da globalização digital.
O sertanejo universitário surge nesse contexto. Ele vem ocupar o espaço dos ritmos que se prestam a proporcionar “diversão sem compromisso”, expressão que não quer outra coisa senão mascarar a baixíssima qualidade da música produzida, além de servir como sentença de absolvição da mediocridade humana de quem ouve esse estilo. Entender o estereótipo do sertanejo universitário, dessa maneira, afigura-se como sendo da mais alta relevância para a compreensão da ideia corrente do que é ser um jovem hedonista no século 21. É o desafio a que me proponho a partir de agora.
O perfil estereotípico do sertanejo universitário
Naturalmente, numa empresa dessa envergadura, precisarei recorrer às letras de algumas das composições mais representativas do estilo. Cuida-se de analisar como pensam os grandes artistas do gênero para, ao final, robustecer um juízo estético-sociológico sobre este conceito indecifrável do “sertanejo universitário”.
Nesse sentido, creio que uma das suas primeiras características é o desapego aos estudos. O sertanejo universitário é um hedonista por excelência. Seu adágio popular dileto, alçado à condição de mote da própria vida, é o clichê: “Pra que estudar se o futuro é a morte?”.
Desse modo, pode ser concebido como um jovem, de péssima formação intelectual e que, a despeito de cursar uma faculdade, não está nem um pouco preocupado com os estudos. Para ele, só existe a balada (o prazer imediato). É o que notamos na composição “Bolo doido”, da dupla “Guilherme e Santiago”: “Ai ai ai sexta-feira chegou! quem não guenta bebe leite e quem guenta vem comigo. Na sexta-feira o bar virou uma micareta. Mulherada foi solteira e os meus amigos loucos pra beber. Da faculdade eu fui pra festa tomar todas com a galera. E fiz amor até amanhecer. Toquei direto, fui à praia com as gatinhas na gandaia. Minha galera bota é pra ferver. Segunda de madrugada, travado, cheguei em casa. Sete horas acordei com uma ressaca, tinha prova pra fazer”.
Mas o sertanejo universitário, para levar uma vida de “baladeiro”, necessita de dinheiro, pois o vil metal tem o condão de, simultaneamente, torná-lo cliente especial da sociedade de consumo e despertar o interesse das garotas mais lindas da balada — verdadeiras empreendedoras no varejo dos relacionamentos humanos. Ele é, assim, um sujeito endinheirado. É o que se observa na composição “Camaro amarelo”, da dupla Munhoz e Mariano: “Quando eu passava por você. Na minha CG você nem me olhava. Fazia de tudo pra me ver, pra me perceber. Mas nem me olhava. Aí veio a herança do meu ‘véio’. E resolveu os meus problemas, minha situação. E do dia pra noite fiquei rico. ‘To’ na grife, ‘to’ bonito, ‘to’ andando igual patrão. Agora eu fiquei doce igual caramelo. ‘To’ tirando onda de Camaro amarelo. E agora você diz: vem cá que eu te quero. Quando eu passo no Camaro amarelo”.
Já sabemos, portanto, que o sertanejo, do tipo universitário, é jovem, de posses, sai da faculdade com seu Camaro amarelo direto para a balada e “bota a galera pra ferver”. Há quem lhe custeie os estudos. E, ainda que ao final de quatro ou cinco anos saia da faculdade no nível de um analfabeto funcional, seus genitores são suficientemente influentes para arranjar-lhe uma boa posição na iniciativa privada ou mesmo no serviço público.
O sertanejo universitário é sujeito destemido, porém sensível. Tem o dom da poesia incrustado nas suas veias. Na balada, este santuário da “pegação da mulherada”, sente a verve aflorar com facilidade, produzindo versos riquíssimos, como os que se notam na composição “Ai se eu te Pego”, do cantor Michel Teló: “Sábado na balada. A galera começou a dançar. E passou a menina mais linda. Tomei coragem e comecei a falar. Nossa, nossa. Assim você me mata. Ai se eu te pego, ai ai se eu te pego”.
De fato, é preciso ser muito perspicaz para rimar “dançar” com “falar”. Sobretudo, me impressiona a profundidade dos versos: quando passa a menina mais linda, ele toma coragem e fala. É um movimento controlado, premeditado. O eu lírico “toma coragem” e “parte para a caça” na balada. Inspirado pela beleza da garota, ele se aproxima e a corteja de uma maneira que qualquer mulher, de Carla Perez a Susan Sontag, sentir-se-ia enamorada: “Ai se eu te pego”, “ai se eu te pego”, ele repete à exaustão o verso aos ouvidos da “garota mais gostosa”.
Contudo, talvez a característica mais significativa desta personagem — o sertanejo universitário — seja mesmo a preferência pelo “idioma da velocidade”. Sertanejo que é sertanejo universitário evita a prolixidade; é sucinto, direto, objetivo. Sua linguagem despreza floreios verbais, construções frasais longas, vocábulos de difícil entendimento. Dado o portento de seu talento poético, ele acentua a desnecessidade do vocabulário complexo, adepto que é da lógica do “dizer muito com muito pouco” ou do “falar fácil é que é difícil”. Conhecedor profundo da fonologia da gramática da língua portuguesa, ele lança mão do rico alfabeto fonético do idioma românico-galego e, conjugando-o com seu ideal filosófico de concisão e com as técnicas redacionais modernas que enaltecem o “texto enxuto”, passa a compor valorizando a mínima emissão de voz na entonação dos seus versos, economizando em palavras o que pode expressar, em seu entender, perfeitamente com vocábulos monossílabos. É daí que nasce a tendência manifesta das composições do estilo em priorizar a vocalização de uma única sílaba. Exemplificativamente, temos: “Eu quero tchu, eu quero tcha”, de João Lucas e Marcelo: “Eu quero tchu, eu quero tchã. Eu quero tchu tcha tcha tchu tchu tchã. Tchu tcha tcha tchu tchu tchã”.
“Eu quero tchu, eu quero tcha” é, sem dúvida, um dos mais formidáveis exemplos de como se pode economizar palavras, de como se pode fundir o dígrafo consonantal “ch” com o “t” e uma vogal (“a” ou “u”) e criar um hit nacional. O significado poético-filosófico do “tchu” e do “tcha” na composição também merece registro: o eu lírico cria um jogo de contrastes, antitético como as leis da dialética, onde o “tchu” só existe para o “tcha”, de modo que não pode haver “tcha” sem “tchu” nem “tchu” sem “tcha”. Daí o porquê de invocar-se as expressões alternadamente, silabando-as na velocidade da luz: “Tchu tcha tcha tchu tchu tchã”.
Na mesma linha vem a composição “Tchá tchá tchá”, cantada por Thaeme e Thiago: “Ai que vontade, ai que vontade que me dá. De te colocar no colo e fazer o tchá tchá tchã. Tchá tchá tchá, Tchá tchá tchã. Tchá tchá tchá, Tchá tchá tchã. De beijar na sua boca fazer o tchá tchá tchã. Tchá tchá tchá, Tchá tchá tchã. Tchá tchá tchá, Tchá tchá tchã. De beijar na sua boca e fazer o tchá tchá tchã”.
Outro exemplo notável do uso de monossílabos é observável em “Lê lê lê”, de João Neto e Frederico. Vejamos: “Sou simples. Mas eu te garanto. Eu sei fazer o Lê lê lê. Lê lê lê. Lê lê lê. Se eu te pegar você vai ver. Lê lê lê. Lê lê lê”.
Mais uma vez temos o eu lírico usando de monossílabos, economizando em palavras, porque riqueza vocabular tornou-se algo desprezível. Sendo possível conotar com um mero “lê”, por que falar mais? O “lê, lê, lê”, no entanto, guarda uma mensagem subliminar perigosa: se tomado isoladamente na segunda pessoa do imperativo afirmativo, pode vir a constituir-se em ordem para leitura. Nada mais distante do que pretende o compositor e a “filosofia de vida” que anima o sertanejo que frequenta a universidade. Logo, é preciso apreender o “lê lê lê” de maneira contextualizada, ou seja, como registro onomatopaico que emula o sentimento de auto compensação libidinosa do eu lírico diante da vergonha que é, numa sociedade de consumo, ter uma condição financeira oprobriosa.
A era da imbecilidade monossilábica
A partir das breves linhas expostas acima, penso que o leitor já se encontra habilitado a conceituar este personagem enigmático do cancioneiro nacional: o sertanejo universitário. Trata-se de um modelo hedônico de uma sociedade capitalista hedonista, marcadamente voltado ao consumo, onde ser um “idiota”, um “imbecil completo”, não só não é motivo de desonra — própria e familiar — como se consubstancia num status socialmente tolerado (diria mesmo instigado). É o estereótipo desejável da sociedade globalizada por relações líquidas sob o elo do idioma da velocidade: no falar, no vestir, no relacionar-se, tudo que se refere ao gênero humano passa numa piscadela. Na música, não é diferente. Predomina o sertanejo universitário como o modelo supremo da juventude irresponsável, mediocrizada, de baixíssimo nível cultural. As composições são cunhadas no esteio da pobreza vocabular de quem as escreve, mas também de quem as canta — em ambos os casos denunciando a mais absoluta falta de leitura. É um autêntico movimento circular, no qual aquele que nada tem a oferecer intelectualmente alimenta com sua arte quem já se encontra morrendo de inanição cerebral.
Por essas razões é que me sinto autorizado a declarar que, depois da hecatombe cerebral que a axé music proporcionou na década de 1990, contribuindo decisivamente na deseducação do povo brasileiro com seus versos de “balançando a bundinha” e “boquinha da garrafa”, o sertanejo universitário, gestado pela indústria fonográfica em crise, desponta como o meio mais fácil de lucrar em cima do desejo hedonístico, cotidianamente instigado pelos meios de comunicação, que impele o jovem a aproveitar a vida a qualquer preço, de qualquer maneira, custe o que custar — incluindo o próprio senso do ridículo daqueles aos quais falta massa encefálica para perceber o quão patético é idolatrar “artistas” incapazes de compor com vocábulos polissílabos. É quando aos olhos de uma garota, na balada, torna-se “bonito” ser um completo idiota. Com o sertanejo universitário, a MIB entrou definitivamente na “era da imbecilidade monossilábica”.
Rafael Teodoro é advogado e músico.
Fonte: http://www.jornalopcao.com.br/posts/opcao-cultural/o-sertanejo-universitario-na-era-da-imbecilidade-monossilabica
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Re: Quarto Contracanto: O sertanejo universitário na era da imbecilidade monossilábica.
Não sei bem como funciona essa parte da revista de transcrição de artigos dos outros. Pode comentar ou é só pra ler?
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Re: Quarto Contracanto: O sertanejo universitário na era da imbecilidade monossilábica.
allexcosta escreveu:Não sei bem como funciona essa parte da revista de transcrição de artigos dos outros. Pode comentar ou é só pra ler?
Bom, essa parte da revista é dedicada a textos - escritos por outras pessoas - cuja leitura possa gerar, na minha opinião (Sendo eu o selecionador de tais escritos), discussões e reflexões.
Colocá-los aqui não quer dizer que eu endosse de forma incondicional o que é escrito por estes outros autores, mesmo porque já tenho aqui um espaço para externar a minha opinião sobre qualquer assunto sobre o qual eu queira falar.
Concordo com algumas das coisas escritas neste artigo (Embora inegavelmente ele seja impreciso em alguns detalhes de sua argumentação... "Na Boquinha da Garrafa" é do Companhia do Pagode e não do É o Tchan, por exemplo), mas não só não detesto axé e sertanejo universitário como também estou longe de concordar com todas as opiniões expressas pelo autor (A minha opinião sobre o Sertanejo Universitário, aliás, é um tema que abordarei em breve em um futuro Contraponto).
De qualquer forma, o autor tem um ponto de vista e ele o defende com bons argumentos, construindo um texto que propõe reflexões e discussões sobre o tema abordado.
Dito isso, opiniões e comentários são muito bem vindos.
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Re: Quarto Contracanto: O sertanejo universitário na era da imbecilidade monossilábica.
Sei lá, cara... O texto é tão superficial e motivado por uma certa dose de inveja que nem sei se vale a pena comentar.
Será que as letras do que esse cara considera boa música são tão boas assim?
Não dava pra pesquisar um pouco e descobrir que É o Tchan não toca Axé?
Enfim...
Será que as letras do que esse cara considera boa música são tão boas assim?
Não dava pra pesquisar um pouco e descobrir que É o Tchan não toca Axé?
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allexcosta- Administrador
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Re: Quarto Contracanto: O sertanejo universitário na era da imbecilidade monossilábica.
Também achei esse texto superficial. E, mesmo sendo superficial, o cara rebusca tanto com palvreado e frases difíceis que chega a doer. Como ele mesmo diz "falar fácil é que é difícil". Pra esse cara, deve ser difícil além da capacidade dele, pq ele não conseguiu.
Isso pra não falar da opinião "ctrl-C, ctrl-V" dele, que é igual a de todos esses "letrados-esquerdistas-de-boinas". Ele sim é que podia parar pra pensar um pouco melhor sobre o que ele está defendendo de verdade.
E olha que eu não curto sertanejo universitário.
Isso pra não falar da opinião "ctrl-C, ctrl-V" dele, que é igual a de todos esses "letrados-esquerdistas-de-boinas". Ele sim é que podia parar pra pensar um pouco melhor sobre o que ele está defendendo de verdade.
E olha que eu não curto sertanejo universitário.
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Re: Quarto Contracanto: O sertanejo universitário na era da imbecilidade monossilábica.
O texto é tão cheio de firulas que o achei engraçado de ler... Bem que o primeiro parágrafo poderia começar assim: "Povo de Sucupira..."
Última edição por pedrohenrique.astronauta em Ter Abr 30, 2013 4:49 pm, editado 1 vez(es) (Motivo da edição : Complemento do post para economia de espaço no tópico)
pedrohenrique.astronauta- Membro
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Re: Quarto Contracanto: O sertanejo universitário na era da imbecilidade monossilábica.
Sei não Zubrycky ...
Mesmo que opinemos a respeito do texto, o autor, talvez nunca fique sabendo disso. E assim fica estranho discutir o assunto.
Já você opinando sobre o artigo, traz o propósito da coluna. Use-o como motivação para desenvolver o que realmente quer discutir ... talvez seja mais produtivo ...
Mesmo que opinemos a respeito do texto, o autor, talvez nunca fique sabendo disso. E assim fica estranho discutir o assunto.
Já você opinando sobre o artigo, traz o propósito da coluna. Use-o como motivação para desenvolver o que realmente quer discutir ... talvez seja mais produtivo ...
Boss2K- Membro
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Re: Quarto Contracanto: O sertanejo universitário na era da imbecilidade monossilábica.
Sendo sincero, Zubrykcy, comecei a ler o artigo com certa discrença na seriedade do mesmo, mas dei uma chance. Mas quando cheguei na metade, ja desisti, chamar axé (ou mesmo sertanejo universitário) de música descerebrada, é no mínimo arrogância! Não sou fã do sertanejo, e não gosto, mas sei que é uma música pensada, apesar de repetida exaustivamente. É uma fórmula que da certo no país, e sim tem teoria, estrutura e motivo de ser. Mesmo que o motivo seja vender.
O axé, então, é um dos estilos brasileiros mais difíceis de tocar. Temos aqui no fórum o Allex que defende o estilo! E as bandas "da triste décade de 90" não tocavam axé no geral!
E a Ivete pode ser sim uma cantora midiatica, mas as músicas dela são mais ricas de harmonia que metade das supostas boas músicas desse escritor.
A partir desse ponto posso estar errado, mas, aposto que o escritor original é fã de "Rock Brasileiro de verdade" como Capital Inicial, Legião Urbana, paralamas do sucesso, cazuza e afins, que usavam das mesmas cadências harmonicas do tão mal visto "sertanejo universitario"
E antes que digam "mas as letras..."
Letra é poema
Música é melodia, harmonia, ritmo, textura, dinâmica.
E o "pobre axé" e o "descerebrado sertanejo" tem muito mais disso que o "quadrado rock brasileiro".
Toquem as pedras, mas achei um lixo esse artigo, nada digno de um Zubrycky
EDIT: O escritor se diz ser advogado e músico, ele é formado em música como é formado em direito? Por que se não for, a avaliação musical dele pode ser tão rasa quanto da minha irmã de 12 anos que toca violão a dois anos e já é chamada de musicista na família.
O axé, então, é um dos estilos brasileiros mais difíceis de tocar. Temos aqui no fórum o Allex que defende o estilo! E as bandas "da triste décade de 90" não tocavam axé no geral!
E a Ivete pode ser sim uma cantora midiatica, mas as músicas dela são mais ricas de harmonia que metade das supostas boas músicas desse escritor.
A partir desse ponto posso estar errado, mas, aposto que o escritor original é fã de "Rock Brasileiro de verdade" como Capital Inicial, Legião Urbana, paralamas do sucesso, cazuza e afins, que usavam das mesmas cadências harmonicas do tão mal visto "sertanejo universitario"
E antes que digam "mas as letras..."
Letra é poema
Música é melodia, harmonia, ritmo, textura, dinâmica.
E o "pobre axé" e o "descerebrado sertanejo" tem muito mais disso que o "quadrado rock brasileiro".
Toquem as pedras, mas achei um lixo esse artigo, nada digno de um Zubrycky
EDIT: O escritor se diz ser advogado e músico, ele é formado em música como é formado em direito? Por que se não for, a avaliação musical dele pode ser tão rasa quanto da minha irmã de 12 anos que toca violão a dois anos e já é chamada de musicista na família.
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Re: Quarto Contracanto: O sertanejo universitário na era da imbecilidade monossilábica.
Achei esse artigo do mesmo jornal em resposta ao dito artigo do tópico
“O que se produziria de melhor do que o sertanejo universitário?”
No texto “O sertanejo universitário na era da imbecilidade monossilábica” (Jornal Opção 1972), o advogado e músico Rafael Teodoro tem razão em estar exaltado quanto ao valor intelectual da música “populacho” brasileira moderna — que chama em seu texto de “Música Imbecil Brasileira” —, especialmente porque devemos mesmo, por ser parte de uma ampla discussão cultural, colocar em seu devido lugar esse tipo de manifestação artística.
Entretanto, o seu raciocínio, por excesso de preconceitos e por falta de análise lógica, entra num vácuo abissal e morre rapidamente por falta de oxigênio quando a) afirma que “do ponto de vista musical, o sertanejo universitário hoje é um gênero musical utilizado comumente para designar a fórmula da ‘música dançante feita para gente descerebrada’”; e quando b) alega, ou deixa entender, que o capitalismo e o consumismo são culpados por essa distorção cultural.
Em relação à primeira afirmação, esta é neutralizada pela história recente, pois quem não sabe que o rock — hoje celebrado e “cerebrado” nas altas rodas “intelectuais”, que adoram dizer que curtem Bob Dylan, Janis Joplin, Eric Clapton e Rolling Stones —, também já foi considerado como sendo “música dançante feita para gente descerebrada”? Quem não sabe também que a bossa nova — outra emulação intelectual — já foi rejeitada pelos nacionalistas por ser uma imitação subdesenvolvida do jazz americano ou pelos conservadores “orlandistas” por ser um tipo de subsamba de expressão minimalista?
De fato, a música denominada, mesmo que erroneamente, “sertanejo universitário” é de uma pobreza musical irritante e até mesmo ultrajante; todavia, sua melhor crítica nunca será tal propriedade de “música dançante feita para gente descerebrada”.
Primeiro, porque não se pode acreditar que ela tenha intenção de ser mais do que um entretenimento festivo para jovens em busca de “baladas”. Na verdade, ela nunca se pretendeu formadora de opinião, nem mesmo chama alguém a qualquer tipo de reflexão. Talvez, nessa visão, melhor caberia criticar, entre várias criticáveis, a música “Construção”, do Chico Buarque (intelectualoide das adolescentes de 60 anos), como sendo, esta sim, música pseudorreflexiva para militantes descerebrados, porquanto como canção que contém um discurso poético infectado de intencionalidades.
Mas, pior fica o raciocínio quando Teodoro alega que o capitalismo e o consumismo são culpados por aquela aberração cultural. Ora, o mercado meramente se compõe e se decompõe em oportunidades e informações das quais empreendedores lançam mão ou não, indo, portanto, para um caminho totalmente contrário ao que o advogado imagina. A demanda e a oferta se casam não como uma imposição do ofertante em querer imbecilizar o consumidor, mas apenas corresponde imediatamente às necessidades e preferências conscientes ou inconscientes deste. Programas televisivos ou radiofônicos, por sua vez, simplesmente identificam a oportunidade de lucro e seguem o padrão. Se disso deriva um consumismo desenfreado por bens que muitos, como esse advogado, acreditam ser inferiores, isto se dá de forma espontânea no mercado.
Se o sr. Teodoro, ao invés de querer criar um modelo (hedônico) sem a menor lógica entre causa e efeito, procurasse um pouco mais, encontraria os verdadeiros culpados de tal fenômeno. Não no mercado, não no “capitalista diabólico” e nem no caráter massificante do estilo musical, mas na genérica limitação intelectual da nação, que — “last but not least” — advém de uma política pedagógica calamitosa de mais de 40 anos, onde o que vale são os desdobramentos de dísticos como “o povo no poder” (“power to the people”?), de um igualitarismo bastardo, e de uma socialização de crenças revolucionárias etc. Ou naturalmente sobrevém de uma educação familiar desgraçada, onde a pobreza e a podridão cultural é reproduzida “ad infinitum”.
Veja bem, se artistas precisam do sucesso, se gravadoras precisam do lucro, se a mídia precisa de um jabá e se o povo quer algo com o qual possa se identificar emocionalmente, o que de melhor no Brasil poderia se produzir no campo cultural?
Everaldo Leite em: http://www.jornalopcao.com.br/colunas/cartas/o-que-se-produziria-de-melhor-do-que-o-sertanejo-universitario
E este comentário no mesmo link:
“Equívocos colossais”
Jorge Rodrigo
O texto de Rafael Teodoro é uma crítica cheia de equívocos colossais. Os anos 1990 não são, nem de longe, a década perdida da música brasileira. Muito pelo contrário, foi nessa década que o Brasil se distancia da dominação cultural americana oitentista e sedimenta-se como uma música universalista que a geração dos anos 80 havia interrompido. O mangue beat (e não foi o único, foi apenas o filão de abertura), expoente maior da década que tantos hibridismos produziu, é uma prova material disso. O movimento Armorial, a cultura de rua, os ritmos marginais dos quatro cantos do País tiveram seu momento pop justamente nos anos 90. Como assim chamar de década perdida o período que serviu para sedimentar os caminhos abertos pela Tropicália? Se formos nivelar pelas listas das rádios nem Chico Buarque, nem Geraldo Vandré nem Gilberto Gil existiriam, em um tempo radiofônico dominado por Odair José e Moacyr Franco.
A impressão que passa é que o autor do texto, legitimamente incomodado com a degenerescência musical do Brasil hoje, se apropria de uma cronologia equivocada e de recursos morais baratos. Precisamos de mais, de muito mais que isso, para promover uma discussão sóbria sobre o assunto. Uma crítica descolada, embasada no senso comum, sem considerar a história como ela foi, mais confunde que ajuda.
“O que se produziria de melhor do que o sertanejo universitário?”
No texto “O sertanejo universitário na era da imbecilidade monossilábica” (Jornal Opção 1972), o advogado e músico Rafael Teodoro tem razão em estar exaltado quanto ao valor intelectual da música “populacho” brasileira moderna — que chama em seu texto de “Música Imbecil Brasileira” —, especialmente porque devemos mesmo, por ser parte de uma ampla discussão cultural, colocar em seu devido lugar esse tipo de manifestação artística.
Entretanto, o seu raciocínio, por excesso de preconceitos e por falta de análise lógica, entra num vácuo abissal e morre rapidamente por falta de oxigênio quando a) afirma que “do ponto de vista musical, o sertanejo universitário hoje é um gênero musical utilizado comumente para designar a fórmula da ‘música dançante feita para gente descerebrada’”; e quando b) alega, ou deixa entender, que o capitalismo e o consumismo são culpados por essa distorção cultural.
Em relação à primeira afirmação, esta é neutralizada pela história recente, pois quem não sabe que o rock — hoje celebrado e “cerebrado” nas altas rodas “intelectuais”, que adoram dizer que curtem Bob Dylan, Janis Joplin, Eric Clapton e Rolling Stones —, também já foi considerado como sendo “música dançante feita para gente descerebrada”? Quem não sabe também que a bossa nova — outra emulação intelectual — já foi rejeitada pelos nacionalistas por ser uma imitação subdesenvolvida do jazz americano ou pelos conservadores “orlandistas” por ser um tipo de subsamba de expressão minimalista?
De fato, a música denominada, mesmo que erroneamente, “sertanejo universitário” é de uma pobreza musical irritante e até mesmo ultrajante; todavia, sua melhor crítica nunca será tal propriedade de “música dançante feita para gente descerebrada”.
Primeiro, porque não se pode acreditar que ela tenha intenção de ser mais do que um entretenimento festivo para jovens em busca de “baladas”. Na verdade, ela nunca se pretendeu formadora de opinião, nem mesmo chama alguém a qualquer tipo de reflexão. Talvez, nessa visão, melhor caberia criticar, entre várias criticáveis, a música “Construção”, do Chico Buarque (intelectualoide das adolescentes de 60 anos), como sendo, esta sim, música pseudorreflexiva para militantes descerebrados, porquanto como canção que contém um discurso poético infectado de intencionalidades.
Mas, pior fica o raciocínio quando Teodoro alega que o capitalismo e o consumismo são culpados por aquela aberração cultural. Ora, o mercado meramente se compõe e se decompõe em oportunidades e informações das quais empreendedores lançam mão ou não, indo, portanto, para um caminho totalmente contrário ao que o advogado imagina. A demanda e a oferta se casam não como uma imposição do ofertante em querer imbecilizar o consumidor, mas apenas corresponde imediatamente às necessidades e preferências conscientes ou inconscientes deste. Programas televisivos ou radiofônicos, por sua vez, simplesmente identificam a oportunidade de lucro e seguem o padrão. Se disso deriva um consumismo desenfreado por bens que muitos, como esse advogado, acreditam ser inferiores, isto se dá de forma espontânea no mercado.
Se o sr. Teodoro, ao invés de querer criar um modelo (hedônico) sem a menor lógica entre causa e efeito, procurasse um pouco mais, encontraria os verdadeiros culpados de tal fenômeno. Não no mercado, não no “capitalista diabólico” e nem no caráter massificante do estilo musical, mas na genérica limitação intelectual da nação, que — “last but not least” — advém de uma política pedagógica calamitosa de mais de 40 anos, onde o que vale são os desdobramentos de dísticos como “o povo no poder” (“power to the people”?), de um igualitarismo bastardo, e de uma socialização de crenças revolucionárias etc. Ou naturalmente sobrevém de uma educação familiar desgraçada, onde a pobreza e a podridão cultural é reproduzida “ad infinitum”.
Veja bem, se artistas precisam do sucesso, se gravadoras precisam do lucro, se a mídia precisa de um jabá e se o povo quer algo com o qual possa se identificar emocionalmente, o que de melhor no Brasil poderia se produzir no campo cultural?
Everaldo Leite em: http://www.jornalopcao.com.br/colunas/cartas/o-que-se-produziria-de-melhor-do-que-o-sertanejo-universitario
E este comentário no mesmo link:
“Equívocos colossais”
Jorge Rodrigo
O texto de Rafael Teodoro é uma crítica cheia de equívocos colossais. Os anos 1990 não são, nem de longe, a década perdida da música brasileira. Muito pelo contrário, foi nessa década que o Brasil se distancia da dominação cultural americana oitentista e sedimenta-se como uma música universalista que a geração dos anos 80 havia interrompido. O mangue beat (e não foi o único, foi apenas o filão de abertura), expoente maior da década que tantos hibridismos produziu, é uma prova material disso. O movimento Armorial, a cultura de rua, os ritmos marginais dos quatro cantos do País tiveram seu momento pop justamente nos anos 90. Como assim chamar de década perdida o período que serviu para sedimentar os caminhos abertos pela Tropicália? Se formos nivelar pelas listas das rádios nem Chico Buarque, nem Geraldo Vandré nem Gilberto Gil existiriam, em um tempo radiofônico dominado por Odair José e Moacyr Franco.
A impressão que passa é que o autor do texto, legitimamente incomodado com a degenerescência musical do Brasil hoje, se apropria de uma cronologia equivocada e de recursos morais baratos. Precisamos de mais, de muito mais que isso, para promover uma discussão sóbria sobre o assunto. Uma crítica descolada, embasada no senso comum, sem considerar a história como ela foi, mais confunde que ajuda.
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Re: Quarto Contracanto: O sertanejo universitário na era da imbecilidade monossilábica.
Bom,
Descobri esse artigo hoje por acaso lá na minha linha do tempo do Facebook e o li, pois gosto de ler sobre música e também sobre a percepção que as pessoas têm dela.
Percebi que este texto está causando vários debates acalorados (E bastante interessantes) no Facebook, no blog aonde ele foi postado e também no site aonde ele apareceu originalmente.
(A seção de comentários destes sites está cheia de apartes pertinentes, a favor e contra o texto).
Tendo em vista os debates que presenciei nestes lugares, tive a idéia de colocar este artigo nesta seção da revista dedicada a textos não escritos por mim para mostrá-lo aos interessados, com a esperança de gerar eventualmente por aqui discussões e reflexões a respeito das idéias debatidas.
Também estava curioso em saber a opinião dos amigos sobre este texto (Mesmo porque o público daqui, por ser músico, possui uma visão diferente daqueles que não são músicos... Não acredito que muitas das pessoas que comentaram naqueles sites tenham alguma idéia do quão difícil é tocar axé, por exemplo).
Sendo assim, no intuito de manter o início de um eventual debate isento das minhas colocações, eu apenas reproduzi o texto e não teci, propositalmente, nenhuma opinião pessoal a respeito dele. Disse depois, é claro, que concordava com algumas coisas e discordava de outras, mas não disse quais coisas são essas.
De qualquer forma, acompanhar os desdobramentos deste texto através da internet está sendo uma experiência interessante, pois sempre aprendo muito ao tomar conhecimento das diferentes idéias que as pessoas têm sobre a música.
Mesmo que eu não concorde com algumas destas idéias, é sempre bom tomar conhecimento dos diversos ângulos de uma mesma questão, mesmo porque eu já conheço os ângulos que sou capaz de vislumbrar e já sei as minhas opiniões sobre determinados temas.
Como bom baixista, apenas ouço.
Descobri esse artigo hoje por acaso lá na minha linha do tempo do Facebook e o li, pois gosto de ler sobre música e também sobre a percepção que as pessoas têm dela.
Percebi que este texto está causando vários debates acalorados (E bastante interessantes) no Facebook, no blog aonde ele foi postado e também no site aonde ele apareceu originalmente.
(A seção de comentários destes sites está cheia de apartes pertinentes, a favor e contra o texto).
Tendo em vista os debates que presenciei nestes lugares, tive a idéia de colocar este artigo nesta seção da revista dedicada a textos não escritos por mim para mostrá-lo aos interessados, com a esperança de gerar eventualmente por aqui discussões e reflexões a respeito das idéias debatidas.
Também estava curioso em saber a opinião dos amigos sobre este texto (Mesmo porque o público daqui, por ser músico, possui uma visão diferente daqueles que não são músicos... Não acredito que muitas das pessoas que comentaram naqueles sites tenham alguma idéia do quão difícil é tocar axé, por exemplo).
Sendo assim, no intuito de manter o início de um eventual debate isento das minhas colocações, eu apenas reproduzi o texto e não teci, propositalmente, nenhuma opinião pessoal a respeito dele. Disse depois, é claro, que concordava com algumas coisas e discordava de outras, mas não disse quais coisas são essas.
De qualquer forma, acompanhar os desdobramentos deste texto através da internet está sendo uma experiência interessante, pois sempre aprendo muito ao tomar conhecimento das diferentes idéias que as pessoas têm sobre a música.
Mesmo que eu não concorde com algumas destas idéias, é sempre bom tomar conhecimento dos diversos ângulos de uma mesma questão, mesmo porque eu já conheço os ângulos que sou capaz de vislumbrar e já sei as minhas opiniões sobre determinados temas.
Como bom baixista, apenas ouço.
Última edição por Zubrycky em Ter Abr 30, 2013 9:28 pm, editado 2 vez(es)
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Re: Quarto Contracanto: O sertanejo universitário na era da imbecilidade monossilábica.
malka_aff escreveu:Achei esse artigo do mesmo jornal em resposta ao dito artigo do tópico
É como diz o antigo provérbio: “Da discussão nasce a luz”.
Última edição por allexcosta em Ter Abr 30, 2013 10:04 pm, editado 1 vez(es) (Motivo da edição : Resposta de uma linha para quote de um livro)
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Re: Quarto Contracanto: O sertanejo universitário na era da imbecilidade monossilábica.
malka_aff escreveu:
E antes que digam "mas as letras..."
Letra é poema
Música é melodia, harmonia, ritmo, textura, dinâmica.
Nem li o artigo que deu preguiça mas não vejo problema nisso. O último disco do Maroon5 tem quilos de la la las e monossilábicos e ninguém reclama disso.
E eu curto!!
Por mim preferia até que a maiorias das músicas do universo nem tivessem letra!!!
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Fernando Zadá- Moderador
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Re: Quarto Contracanto: O sertanejo universitário na era da imbecilidade monossilábica.
eu to numa onda bem instrumental, Zadá, e não sei se por estar estudando música mais afundo to entendendo melhor o compositor ou se por hoje estar entendendo melhor o compositor, estou estudando música com mais vontade.
Mas as duas coisas se completam belamente =)
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